sexta-feira, 7 de março de 2008

O Segredo do Segredo

O Segredo Escondido de “The Secret”: Sobre tudo aquilo que os homens bem sucedidos e os autores capitaneados por Rhonda Byrne não querem que você saiba !!

Por Arthur Meucci

Crítica Filosófica

Parte I – As leis ocultas do sucesso

Cheguei neste fim de semana na minha cidade de criação, Peruíbe. Vim passar as festas de fim de ano na casa de meus pais como faço desde que me conheço por gente. Nestes últimos seis anos sinto que cada vez mais estas visita são uma experiência antropológica singular. Saio do “Olímpio” da Universidade de São Paulo, dos meus círculos sociais, e sou imerso no que parece uma outra realidade paralela. Volto ao mundo da dita “normalidade”, onde se vive o dia-a-dia comum da maioria dos brasileiros. Se nos meus círculos em São Paulo o mundo parece progredir em relação ao conhecimento, a consciência, e a estabilidade, em Peruíbe vejo que esta percepção não é universal. O mundo muda com radicalidade. Cada vez mais as novas modas dão formato ao mundo. Cada vez menos as pessoas têm consciência do que assistem nas mídias e do que lêem na lista de “best sellers” (quando são capazes der ler…). Sinto a todo tempo um vazio gerado no mundo ao meu redor devido a uma estagnação do progresso econômico, educacional e humano.

Todo ano novas modas tomam conta de ocupar a vida das pessoas. Este ano uma nova “onda” surgiu, e desta vez me atingiu em cheio. Até pouco tempo ninguém dava realmente importância para a filosofia, e muito menos para seus estudantes. Quem é filósofo sabe do desprestigio que recebemos de nossa sociedade, e já estamos habituados a este estado de limbo social no qual somos colocados. Pois bem, desta vez inexplicavelmente pessoas, conhecidas ou não, me paravam na rua querendo conversar. Perguntavam se eu tinha feito filosofia e se eu poderia lhes dar alguma “revelação”. O entusiasmo das pessoas me constrangia. O que diabos estava ocorrendo? Estava há menos de doze horas na cidade e parecia um político famoso no qual todos vêem me pedir favores e conselhos. Será que minha aparição em alguns poucos programas de TV neste ano causaram isso? Improvável, pois as pessoas pediriam autógrafos e não conselhos e indicações de livros.

Após um dia de inquietações meus pais me revelaram o motivo de todas aquelas manifestações estranha. Este fenômeno foi gerado por um novo discurso ideológico trazido por um livro escrito pela filosofa americana Rhonda Byrne, intitulado “The Secret – O Segredo”, publicado pela Ed. Ouro, e por um filme com o mesmo título. Uma nova gama de livros publicados por filósofos, físicos, e psicólogos americanos, denominados filósofos do “Segredo”, ou da “Lei de Atração”, disseminou um discurso ideológico e uma mudança de comportamento tão grande que eu não tinha visto igual desde a década de noventa com o crescimento repentino do AMWAY (American Way of Life). Tive a oportunidade de ler o livro de Rhonda Byrne e de Michael Loiser, intitulado “A Lei da Atração”, Editora Nova Fronteira, além de assistir o filme.

Os livros, apesar de possuírem muitas páginas e serem escritos por filósofos e físicos, tinham poucos textos e utilizavam uma linguagem cotidiana. O estilo de escrita e de edição possibilitava até mesmo pessoas pouco instruídas lerem e entenderem. Li os dois livros em menos de quatro horas. Creio que não houve dificuldades de traduzir os livros, mas certamente houve um grande esforço dos diagramadores em transformar vinte páginas de texto corrido em duzentas páginas de livro. Rapidamente percebi que esta nova “corrente filosófica” não tinha nenhuma consciência ambiental.

Após assistir o filme as pessoas ao meu lado ficaram ansiosas para saber o que eu iria dizer. Esperavam uma palavra de sabedoria, ou pelo menos uma avaliação positiva de minha pessoa que reforçasse suas crenças. Fui a cozinha, peguei um copo de café amargo, sentei, cruzei as pernas, fiz um ar de arrogância típico dos intelectuais e disse: Como eu suspeitava o filme não revelou os segredos ocultos sobre a “lei de atração”. A autora não revelou as leis mais intrínsecas que possibilitam o sucesso dela e dos milionários bem sucedidos. Depois de dizer tudo isso, com tom de obviedade, me calei.

Em toda a minha vida nunca causei tanto frisson nos meios sociais que circulo quanto desta vez. A minha observação na cozinha da casa de meus pais circulou até os mais distantes confins da cidade. Todos me questionavam: Que segredos são estes que eles não revelaram? Desde o dia de Natal até este momento passo o meu tempo explicando para as pessoas que me procuram algumas das “leis ocultas” que possibilitam o sucesso da “lei de atração”. Como prometido, disponibilizo para as pessoas duas das leis ocultas em “The Secret” que Byrne e os demais não querem contar. As leis que vou tratar neste primeiro post sobre o assunto são as “Lei da Alienação” e a “Lei da Mais Valia”.

Os autores se colocam uma questão inicial nos livros e no filme. Eles perguntam: Por que desde os tempos antigos somente uma minúscula parcela da população é rica e bem sucedida, tem tudo o que deseja, e a grande maioria dos homens vivem de maneira ruim? A resposta deles para isso é: Desde os primórdios da civilização uma minúscula parcela da população descobriu a chamada “lei da atração”. Em linhas gerais eles definem esta lei, “Atraio para a minha vida qualquer coisa à qual dedico atenção, energia e concentração, seja em termos positivos ou negativos” (LOSIER, 2007, p. 25). Na verdade a filosofia, desde o século XIX, já desvendou as verdadeiras leis para este sucesso. As leis que movem os dominantes do mundo são anteriores e mais profundas do que a lei de atração. A primeira lei do sucesso, que um indivíduo precisa conhecer para se dar bem, é a Lei da Alienação. A filosofia entende por alienação o processo pelo qual um homem se aliena, ou seja, deixa de ser dono de si mesmo e, conseqüentemente, do que produz. Um trabalho alienado é um trabalho cujo seu fruto não pertence a quem produz, mas a uma outra pessoa: Seu senhor, seja o escravocrata ou o patrão.

Como se aplica a “Lei de Alienação”? É simples. O primeiro passo para ser bem sucedido é, primeiro, passar a ser dono do que você mesmo produz. Se você fizer pão, software, costura, ou der aula, você deve ganhar exatamente pelo que produz e não outra pessoa. O segundo passo é achar outras pessoas que se submetam ao seu domínio. Ou seja, encontrar empregados que trabalhem para você. Eles não devem receber pelo que efetivamente fazem, e sim ganhar um salário. Você não deve manter uma relação de “pareceria” ou de “sócio” com estas pessoas, e sim de “senhor/patrão” e “servo/empregado”.

Após aplicar a “Lei da Alienação” você deve aplicar uma segunda lei, a “Lei da Mais Valia”. Segundo esta lei deve haver uma grande diferença entre o salário pago ao seu empregado e a riqueza que ele produz. A idéia é: Uma vez que você domina seu empregado pela Lei da Alienação você deve explorar esta pessoa ao máximo fazendo com que ela trabalhe muito e ganhe pouco. Você simplesmente deve oferecer um salário para que ele se mantenha vivo, tenha um mínimo de conforto, e faze-lo crer que o trabalho que você lhe ofereceu é um favor. Mas como estas leis funcionam na prática?

Para exemplificar o funcionamento delas relatarei um caso que realmente aconteceu. Tenho um parente que é padeiro numa padaria de alto padrão em Peruíbe. Ele seguia fielmente os mandamentos do “Segredo”, da “Lei da Atração”, e passou a admirar seu patrão que sem dúvida é um homem de sucesso. Ele, como muitos, começaram a admirar os grandes capitalistas como Abílio Dinis, Bill Gates, e outros que são tidos como sacerdotes que conhecem os segredos da Lei de Atração e aplicam.

Para revelar os “Segredos” eu prometi desvendar as artimanhas que seu patrão usava para ficar rico. Pedi para que ele, brevemente, me relatar sua produção mínima diária na padaria. Contar como ele trabalha e o que ele produz num dia de baixo movimento.

Ele me relatou que em um dia fraco, de não temporada, ele levanta às 4 horas da manhã, entra no serviço às 5 horas em ponto, e tem que fazer 1.500 pães, 100 baguetes, 30 sonhos, 60 croissant e brioches, 100 pães de queijo, além de outros quitutes como língua de sogra, esfiras, tortas, bolos etc, antes do patrão chegar. Sentei com o meu parente padeiro portando uma folha de papel, um lápis, uma borracha e uma calculadora. Disse que somente estes instrumentos seriam necessários para decifrar a verdadeira lei oculta do “Segredo” – a chave para os vencedores. Pedi para ele imaginar um outro sistema de ganho onde ele trocaria seu ordenado mensal de R$ 800,00 por um cálculo de ganho pessoal através de um mínimo sobre cada produto que produz. Disse: Pense num sistema onde você ganhasse liquido (descontado encargos sociais) R$ 0,03 por cada pão, R$ 0,06 por baguete, R$ 0,15 por sonho, R$ 0,18 por brioches e croissants, e R$ 0,07 por pão de queijo que produz. Para tornar a coisa mais simples não contabilizamos suas outras produções. Depois verificamos a tabela de preços.

Nesta padaria de alto padrão um pão de 50 gr. custa R$ 0,35 (trinta e cinco centavos), uma baguete de 100 gr. R$ 0,70, um sonho R$ 1,50, croissants e brioches R$ 1,80 cada, e o pão de queijo R$ 0,70.

Com esses dados em mãos pedi para ele fazer alguns cálculos no intuito de analisar e achar o “segredo”. Partimos das variáveis mais pessimistas possíveis. Estamos calculando segundo uma média de um dia ruim de vendas, e depois estendemos essa situação para o período de um mês. Além disso, eu o fiz observar que sua média de ganho por cada produto que produz varia entre 6% e 10% do preço final. Afinal, ele está preso a Lei de Alienação e não se vê dono do que produz, logo não consegue se ver exigindo mais. Começamos contabilizando o seu ganho e depois o da padaria sobre estes itens específicos.

* Padeiro
Ganho diário:
Pão R$ 45,00 (0,03), baguete R$ 3,00 (0,06), sonho R$ 4,5 (0,15), croissants e brioches R$ 10,80 (0,18), pão de queijo R$ 7,00 (0,07).
Total por dia: R$ 70,30 (setenta reais e trinta centavos)
Em 24 dias:R$ 1.687,20 (mil seiscentos e oitenta e sete reais e vinte centavos)

* Padaria (Descontado a porcentagem do padeiro, e sem calcular a média de 23% de impostos e encargos sociais – Obs: setores alimentícios têm impostos reduzidos).
Ganho diário:
Pão R$ 480,00 (0,32), baguete R$ 64,00 (0,64), sonho R$ 40,50 (1,35), croissant e brioches R$ 97,20 (1,62), pão de queijo R$ 63,00 (0,63).
Total deste lucro específico por dia: R$ 744,70
Total deste lucro específico em 24 dias: R$ 17.872,80

Primeiro eu lhe mostrei a “Lei da Alienação”. O fiz comparar seu salário de R$ 800,00 com a mísera porcentagem de lucro que ele poderia ter sobre o fruto de seu trabalho. Inicialmente ele mostrou indignação com os cálculos. Disse: “- Não pode ser só R$ 1.687,20. Esta é uma média muito baixa. Não existe. Eu produzo, num mês, uma média maior do que esta sem contar as tortas, bolos e outras coisas. Provavelmente eu poderia tirar uns R$ 3.000,00 nestas condições”. Logo depois deste discurso ele começou a enxergar as duas leis ocultas. Ele percebeu que trabalhava “quase de graça” para seu patrão. Ele percebeu que trabalhava muito, mas era o dono da padaria que recebia os lucros sem fazer muito esforço. O Segredo da Alienação se revelou.

Em seguida eu o fiz ver a “Mais Valia”. Disse: Veja bem o quanto você ganha sendo um alienado do senhor capitalista. Você ganha R$ 33,33 por dia como um escravo assalariado do sistema. Se você mendigasse uma mísera porcentagem por todo o trabalho que produz sozinho ganharia diariamente, na pior das hipóteses, R$ 70,30 por dia, R$ 1.687,20 por mês. Mais do que o dobro como assalariado. Mesmo assim, recebendo esta ridícula parte do que produz, o patrão ganharia R$ 744,70 pelo seu trabalho diário, e em vinte quatro dias de exploração ganharia um total de R$ 17.872,80. O padeiro olha abismado e confessa: “- Sou eu quem encomenda às compras de material, e num período como este ele não chega a gastar mais do que R$ 3.500,00 por mês com os ingredientes.” Ele compara os R$ 13.000,00 (descontando os ingredientes) de lucro do patrão, só com os pães que ele produz, com os R$ 1.687,20 que ele poderia mendigar, e depois com os R$ 800,00 de salário.

Mostrei, nesta primeira reflexão, as duas leis ocultas necessárias para o sucesso. Segredos que Byrne e os demais capitalistas dominantes não querem que você saiba. Mas agora você já sabe: Para se ter sucesso é preciso, primeiro, ser “senhor” de outros homens e depois explora-los o máximo possível. Nunca pagar pelo que o trabalho dos outros realmente vale. Se você ainda quiser pode pedir invocando a “Lei da Atração” que lhe transforme num alienador de homens e detentor dos trabalhos de outrem.